Como Uma Música Sertaneja Virou Motivo De Discussão Na Justiça do Trabalho
Indenização por danos morais
TRABALHISTA


A dupla Tião Carreiro e Pardinho, ícones da música raiz brasileira, emplacou várias musica de sucesso entre os anos 50 e 90.
Suas canções exaltavam o encanto da vida no campo, o contato com a natureza, a dureza do trabalho na roça, a crença em Deus, inclusive valores como a honra e a lealdade.
Pelo brilhantismo, até hoje suas músicas são ouvidas e celebradas, compondo, desse modo, a cultura e o imaginário popular.
Uma das músicas mais famosas da dupla chama-se "Boi Soberano", resumidamente, a letra ilustra a memória de um boiadeiro que relembra uma passagem de sua vida, especificamente a condução de uma boiada composta por 600 animais. Dentre os animais, existia um boi traiçoeiro que se chamava Soberano.
A boiada estourou ao chegar na cidade de Barretos, situação que causou medo e pânico nos habitantes. Para piorar a situação, existia uma criança brincando na rua quando todo o desespero começou.
Quando se deu conta do que ocorria, o menino desmaiou de medo justamente na frente do Soberano. Para a surpresa de todos, o temido boi parou na frente do garoto e impediu que os outros animais o pisoteassem.
Você deve estar se perguntando: o que essa música tem a ver com Direito do Trabalho, estou certo?
Pois bem, de acordo com o art. 7º, XXII, da CF, compete ao empregador garantir um ambiente de trabalho limpo, seguro e saudável. Especialmente saudável no ponto de vista da saúde mental. Nesse aspecto, cumpre ao empregador ainda zelar pelo respeito no local de trabalho.
Nesse sentido, o empregador deve impedir condutas que são capazes causar danos à esfera moral ou emocional dos trabalhadores.
As práticas abusivas mais comuns no ambiente de trabalho são:
Apelidos pejorativos;
Exposição dos subordinados ao ridículo;
Piadas ofensivas;
Brincadeiras de mau gosto;
Desconsideração da opinião técnica de uma funcionária em razão do sexo;
Submeter subordinados a situações humilhantes.
Situações como as listadas acima violam a dignidade (art. 1°, III, da CF), a honra e a imagem do trabalhador (art. 5°, X, da CF) e, por essa razão, podem gerar indenização por danos morais (art. 186, do CC).
Nesse sentido, oportuno trazer à baila o caso concreto que motivou a elaboração do presente artigo.
O caso trata-se de uma reclamação trabalhista em que o empregado requereu, dentre outros pedidos, o pagamento de indenização por danos morais em desfavor do empregador por ser tratado com palavras de baixo calão, em especial ser chamado por seus colegas de trabalho constantemente de "corno" e "soberano".
Percebe-se que tais apelidos foram utilizados no sentido de infidelidade conjugal, mormente para atingir a honra do traído no ambiente de trabalho.
O Juízo de primeira instância proferiu sentença no sentido de indeferir a pretensão obreira de indenização por danos morais. Nos fundamentos da sentença, o Juízo sentenciante concluiu que não havia responsabilidade do empregador em relação às ofensas, pois, no seu entendimento, tudo não se passava de brincadeira entre amigos.
Inconformado, o empregado recorreu ao TRT, onde prevaleceu o entendimento de que competia ao empregador primar pela urbanidade no local de trabalho, sobretudo reprimir comportamentos inadequados dos empregados. O Regional ainda entendeu que a culpa do empregador restou demonstrada justamente por sua omissão em conter as brincadeiras de mau gosto. Dessa maneira, a sentença foi reformada para condenar o empregador ao pagamento de indenização por danos morais.
Irresignado, o empregador recorreu ao TST, entretanto, no julgamento do AIRR, a 7ª turma do TST entendeu correta a abordagem do TRT. Dessa maneira, foi mantida a condenação do empregador ao pagamento de indenização por danos morais em favor do empregado.
A propósito, segue abaixo a ementa citado julgado:
AGRAVO DE INSTRUMENTO - INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS - CONSTRANGIMENTO - expressões pejorativas e de baixo calão DIRIGIDAS AO RECLAMANTE POR COLEGAS - DEVER PATRONAL DE ZELAR PELA URBANIDADE NO LOCAL DE TRABALHO - OMISSÃO DA RECLAMADA - INTERPRETAÇÃO RAZOÁVEL DOS DISPOSITIVOS LEGAIS PERTINENTES - SÚMULA 221, II, DO TST - DIREITO DE REGRESSO POSTERIOR. 1. A controvérsia dos autos, dentre outros temas, diz respeito a pedido de indenização por danos morais decorrentes de constrangimento no ambiente de trabalho, em razão de tratamento com expressões pejorativas e palavras de baixo calão entre os empregados. 2. O Regional concluiu que ficou configurado o dano moral alegado pelo Reclamante, em virtude de comumente ser chamado de "corno" ou de "soberano", sendo esta última expressão usada como sinônimo de corno, além de ser tratado por outras palavras de baixo calão. Consignou que cabia à Empregadora zelar pela urbanidade no local de trabalho, devendo reprimir comportamentos inadequados, e que nem todas as pessoas são tolerantes a brincadeiras de mau gosto. Assentou ainda que a culpa ficou demonstrada pela omissão da Reclamada em coibir tal conduta. 3. Sustenta a Reclamada que as provas produzidas não foram corretamente apreciadas, de forma que se pudesse atribuir-lhe alguma culpa, e que o Reclamante não se desincumbiu do ônus de demonstrar o suposto dano sofrido. Alega que foi correto o entendimento vertido na sentença, que concluiu não haver responsabilidade da Reclamada pelos fatos narrados, porquanto se tratava de uma brincadeira entre amigos para descontrair, a qual todos aceitavam e da qual participavam, inclusive o Recorrido. 4. Diante da situação delineada nos autos, tendo o Regional consignado que as palavras ofensivas e as de baixo calão que eram dirigidas ao Reclamante configuravam dano moral por submetê-lo a constrangimento e que estavam presentes a culpa e o nexo causal entre a conduta e o dano, conferiu entendimento razoável às normas legais pertinentes, o que atrai o óbice da Súmula 221, II, do TST. Por esse mesmo motivo, não aproveita à Recorrente a tese de violação dos arts. 186 e 927 do CC e 131 do CPC. 5. Por fim, deve ser ressalvado o direito de regresso da Reclamada para cobrar a indenização por danos morais em que foi condenada, frente aos ofensores imediatos, nos termos do art. 934 do CC. Agravo de instrumento desprovido. (AIRR - 284440-23.2003.5.15.0122, Relator Ministro: Ives Gandra Martins Filho, Data de Julgamento: 11/06/2008, 7ª Turma, Data de Publicação: 13/06/2008).
Caso esteja passando por uma situação semelhante procure a orientação de um advogado especialista em Direito do Trabalho.